sexta-feira, 17 de abril de 2009

Aconteceu na Páscoa!!

O menino estava ali, de pé no chão, sob a luz do poste da rua, observando os bichinhos de pelúcia dependurados na vitrine, abraçando grandes ovos de chocolate. Era a tal da Páscoa, que ele sempre ouvia dizer. Na casa dos patrões da mãe, que trabalhava como doméstica e só a cada 15 dias voltava para vê-lo, se fazia uma grande festa. Toda a criançada ganhava montes de chocolates e umas até iam parar no hospital, de tanto comer doce.
Quando as crianças não gostavam de algum bombom ou achavam o pacote muito feio, deixavam que a mãe o levasse para ele. Só assim podia sentir o gosto daquela delícia de cor marrom. Da cor ele não gostava, porque lembrava o chão da casa, de terra batida. Mas do resto... era tudo delicioso.

Quando o doce acabava, ele guardava os papeis embaixo do travesseiro, como relíquias, e passava o resto do ano cheirando cada um deles. Pra matar a vontade e ajudar a esperar até a Páscoa seguinte.

Certa vez, ele perguntou a uma vizinha rica, que todo domingo de manhã ia à igreja, o que era a Páscoa.

A mulher, que cheirava a perfume e parecia que tomava banho todos os dias ao contrário dele que só via água uma vez por semana, da torneira da casa de uma prima, que deixava que ele se banhasse sem cobrar nada abaixou-se para falar olhando em seus olhos e explicou que era uma data religiosa muito importante, que significava renascimento. Que nesta data, as pessoas deviam refletir melhor sob suas existências e tentar ser melhor do que tinham sido até então. E que as pessoas verdadeiramente boas seriam recompensadas com uma vida agradável.

Aquelas palavras nunca saíram de sua cabeça.

O perfume da mulher também demorou a sair de seu nariz, mas um dia ele foi embora. A imagem dela, no entanto, ainda guardava bem viva na lembrança. Afinal não eram todas as pessoas que se dignavam a falar com ele, um menino pobre, piolhento, de nariz escorrendo, negro e com a barriga cheia de vermes, que perambulava pelas ruas o dia inteiro, com medo de voltar pra casa e apanhar do pai, um sujeito malvado, viciado em crack e alcoólatra, cuja diversão era bater no filho e tomar o dinheiro da mulher.

Mais uma vez a Páscoa tinha chegado e ele não tinha visto nenhum renascimento. Pelo contrario, as coisas estavam até piores, com o pai mais drogado e a mãe mais distante, mais sofrida. Olhando os bichinhos e o colorido da vitrine, ele não conseguia entender como que alguém poderia pensar em se tornar melhor do que tinha sido anteriormente, se antes não tinha sido nada.

E concluiu: "Essa coisa de Páscoa deve funcionar só pra rico. Pobre não tem vez..."

PS: Só pra lembrar, Jesus nasceu em uma manjedoura....

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